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Três Poemas para Antunes Filho

Antunes Filho

1.
Com o tempo ele foi ficando
cada vez mais parecido
com Kazuo Ohno,
embora ele não trabalhasse
sobre o tablado.
Ele dirigia quem sobre o palco
se movia.
Com o tempo ele foi ficando
cada vez mais oriental,
embora lesse dramaturgias ocidentais.
Intérprete do Brasil,
ele foi lupa sobre Suassuna,
lupa sobre Lima Barreto,
lupa sobre Nelson Rodrigues.
Com o tempo ele se tornou um vate,
embora poeta não fosse.
Não foi?
Foi, não foi.
Ele encena a tragédia grega
em sua dicção brasileira.
Ele, embora Filho, para muitos foi pai.

2.
Preta, branca e cinza
a revoada
de pombas sujas
se confunde com o cinza
do céu assoprando nuvens.
Manchas desenham o céu da cidade.
Ao Deus-Café esta primeira pessoa
já bateu cabeça.
Agora, sua noite de vigília
desidratado de lágrimas
evaporadas ao mestre dos palcos.
Preta, branca e cinza
a revoada de pombas sujas
forma coro
de carpideiras a Antunes.
O cortejo fúnebre sairá
do Teatro Anchieta.

3.
Agora, cremado o corpo,
chorada a perda,
bebido o homem morto,
outra memória destampa-se.
Agora, cerimônia de adeus feita,
eu me lembro de Nova Velha Estória.
Me lembro do efeito
da delicadeza
em tempos tão duros.
Agora, fica a memória
de fita verde no cabelo,
a pré-língua babélica
a contar para as gerações futuras
a crueldade de Chapeuzinho Vermelho.

 

Foto de Capa Sesc SP Divulgação

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