Search

O mês do orgulho acabou, e agora?

menina bandeira

Quando chega o mês de junho, anualmente, nós LGBTQIAP+ somos bombardeados por todos os lados por logos das mais variadas marcas com modificações coloridas nas cores do arco-íris. Isso é bom? Ou será que somos apenas os potes de ouro no fim do arco-íris?

Historicamente estamos acostumados a nos darmos por satisfeitos com as poucas migalhas que caem da mesa comemorativa heteronormativa, e muitas vezes não nos damos conta de que as poucas conquistas que tivemos não são celebradas ou lembradas.

É quase nula a quantidade de empresas que aproveitam do “engajamento” do orgulho para de fato celebrar tal orgulho. Não vemos a maioria esmagadora deles falando sobre a Revolta de Stonewall, ou do que talvez tenha sido a nossa Stonewall, o levante no Ferro’s Bar, liderado pelas lésbicas paulistas.

É doloroso muitas vezes percebermos que até mesmo nós, membros dessa comunidade não conhecemos nossa própria história de lutas, e partindo disso, o próprio apagamento da mesma, que vem sendo feito dia a dia, sem que nem percebamos.

Aprofundando um pouco no caso da revolta do Ferro’s Bar, pensemos que o mesmo era um dos bares mais frequentado pelo público lésbicos nas noites de São Paulo, e quando a publicação do folhetim “Chana com Chana” começou a incomodar os donos do lugar e foi proibido de ser comercializado ali, temos a primeira onda de pensamento: O público lgbtqiap+ serve muito bem como público consumidor, entretanto, não levante a sua bandeira.

O “Chana com Chana” utilizava desse informativo para dar mais visibilidade às mulheres lésbicas, era extremamente cultural e lutava abertamente contra o preconceito, coisa que na época e no contexto no qual estava inserido, ainda era muito recente.

No texto manifesto, lido no dia do levante no Ferro’s, podemos destacar um trecho em específico:

“E PRECISAMOS COMEÇAR A BATALHAR POR ISSO A PARTIR DOS LUGARES QUE FREQUENTAMOS E SUSTENTAMOS. OU NÓS NOS UNIMOS OU CENAS COMO A DO SÁBADO PASSADO CONTINUARÃO A OCORRER E PODERÁ SER COM QUALQUER UMA DE NÓS POR QUALQUER MOTIVO.”.

Volto então a discussão inicial desta coluna: O mês do orgulho é de fato uma forma de nos orgulharmos de nossa história ou atualmente somos apenas a fonte de ouro das marcas “empoderadas” que se usam de tal para alcançarem mais visibilidade, inclusive por meio das inúmeras polêmicas que são geradas nesse período?

Talvez o que mais devamos pensar é: precisamos conhecer a nossa história e as nossas lutas. Somos marginalizados dia a dia, e infelizmente nem sempre estamos prontos para rebatermos os argumentos de uma sociedade que majoritariamente está aí a postos para nos tacar a primeira pedra, afinal, “que pouca vergonha um casal de mulheres comprando perfumes juntas”, ou, “credo dois homens abraçados na propaganda do banco”. O mundo heteronormativo deixou de compreender que não somos a exceção, nós existimos, nós somos sociedade, nós somos consumidores, e não somos um bloco separado do resto do povo.

Devemos sim nos orgulhar das lutas que foram feitas lá atrás na história, para que tivéssemos a visibilidade que temos hoje (e que a muito custo está sendo limada de nós outra vez). Muito sangue foi derramado, e não no sentido figurativo apenas, infelizmente, e muitas das pessoas que deram o sangue vem sendo esquecidas (Marsha P. Johnson, presente).

Não deixemos outra vez, que sejamos usados apenas como moeda de troca comercial, mas sim, como forma de sermos respeitados pelo que somos e pelas lutas que travamos todos os dias.

A luta das pessoas trans por empregabilidade (e não por migalhas de empregos com diferenciação de salários, sempre para baixo), a luta de todas as letras da sigla para serem compreendidas como SERES HUMANOS e não vistos apenas como forma de ganhar algum dinheiro.

O mês do orgulho acabou, e agora nós fazemos o resto do ano de orgulho. Agora é a nossa hora de correr atrás do reconhecimento e das nossas lutas. É o nosso momento de marcar a história assim como nossos iguais marcaram no passado.

Deixo aqui duas indicações culturais sobre o assunto. Primeiramente o documentário “A morte e a vida de Marsha P. Johnson”, doloroso e cruel, conta a história de Marsha e de sua luta pela visibilidade. E o vídeo sobre a revolta do Ferro’s Bar, no canal da drag queen brasileira Lorelay Fox, é muito completo e tem provocações incríveis.

Nós somos o futuro, e nossas lutas ainda são as mesmas; A questão que fica é: até quando? Nada vai mudar?

Nós resistiremos e seremos história. Seja história e seja luta. Para que no ano que vem, quando chegarmos no final do mês do orgulho, não olharmos para trás e pensarmos: o mês do orgulho acabou, e agora? Nada mudou?

Foto de capa por Isi Parente em Pexels

2 respostas

  1. Muito bom, Bettinhausen! Temos poder, nosso suado “Pink Money” precisa ser gasto com empresas que estão realmente engajadas com a causa o ano inteiro

    Vamos lutar pela empregabilidade trans, pelo fim do preconceito de toda a espécie e fazer do mundo um lugar melhor para as futuras gerações ❤

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *