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Crítica da Razão Erótica

Pensar e viver no século XXI nos coloca de frente a uma realidade – líquida: as mídias sociais. Impossível principalmente, no mundo ocidental, encontrar alguém que não esteja conectado. Fazem anos que evitamos perguntar, em pesquisas, quanto tempo alguém fica conectado por dia. A pergunta é quem desliga seu telefone? Essa rede de conexão trouxe uma série de elementos novos e importantes. O debate, agora, gira em torno, especificamente, da forma como as mídias sociais são utilizadas para aproximar-se de alguém.

Importante ferramenta para alcançar “likes” são as fotos disponibilizadas por quem deseja, pelo menos, uma nanoatenção. Se eu entendi bem, quanto menos roupas, mais atenção. Ou seja, é preciso se despir cada vez mais para que alcance o eros do outro. É importante nos reconectarmos a nós mesmos, assim como também precisamos aprender a nos conhecer e aceitar nossos corpos, mas nem sempre é isso que ocorre nessas mídias.

Muitas vezes é uma apresentação de si no intuito de criar uma imagem que, inclusive, não diz, exatamente, quem você é – talvez diga quem você gostaria de ser. Em nossa fauna não é difícil encontrar pessoas – inclusive em relações estáveis – que a todo momento se questionam e questionam o companheiro sobre a estabilidade e parceria da relação. Porém, ao conhecer e tentar entender a dinâmica do problema é visível como um, ou muitas vezes os dois, que alegam exclusividade, não param de postar fotos – algumas delas com extrema intimidade à vista – para todo mundo ver. A pergunta é qual a intenção?

É possível imaginar que é apenas um bom dia amistoso? É arte? É apenas uma inocente aceitação de si – e por isso todos podem ver, curtir e elogiar privadamente sem o conhecimento do parceiro? Amigos, inocência tem limite. Como você acha que seu parceiro se sente quando você não para de “conversar” com estranhos sobre suas sucessivas fotos. Lembre-se: você aceitou a exclusividade. Ou seu parceiro se enganou? Não seria oportuno ambos sentarem e conversarem sobre as fronteiras entre o que funciona ou talvez não funciona para o casal. Essa linha não é delimitada rapidamente. Na verdade, é intrínseca ao tempo e maturidade da relação construída.

Immanuel Kant (1724-1804) nos ensina que, movidos por desejos e paixões, na busca desenfreada para alcançar a felicidade humana (se é que existe) agimos pelo imperativo hipotético. O problema é que, geralmente, o que chamamos de felicidade, na verdade, é prazer. A somatória dos prazeres resulta na felicidade? Proponho que você mesmo responda esta pergunta, amigo. Será que devemos depositar nossa felicidade nas curtidas daqueles que estão nos vendo? O seu parceiro demonstra felicidade e aceitação diante da forma como você posta fotos? Esse questionamento é importante para você?

Sim, vivemos em uma sociedade na qual a erotização de tudo principalmente por meio das mídias sociais é avassaladora. Vale a pena nos perguntarmos o quanto isso nos define? Acredito que essa resposta também é pessoal. Mas, vale a reflexão: será que mensurar, exclusivamente, nossas relações por meio do corpo vai garantir o alcance da felicidade? Por trás disso, o que buscamos realmente?

Na mesma medida, Kant nos oferece o imperativo categórico – conceito difícil de definir e praticar. Mas, contém em si importante ensinamento: em alguns momentos temos de aprender a controlar sentidos em nome de algo maior. O que seria esse algo maior, para você? Mais uma pergunta para sua reflexão pessoal. Conviver com o outro nos coloca em posição de ter de fazer escolhas. Lembre-se: o outro fez escolhas, abriu mão de coisas e pessoas, e preferiu você. E você?

A proposta da reflexão de hoje é se questionar ao postar fotos nas redes sociais. A meta é provar para os outros, e para si mesmo, que você é livre – e precisaria estar sem roupas para demonstrar isso? Há quem diga: cada cabeça uma sentença. Última pergunta, prometo: Que tipo de eros atraímos para perto de nós por meio das nossas fotos?

Foto de capa por Adrianna Calvo no Pexels

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