Search

Discutindo o Preconceito no Cinema Nacional

Carlinhos e Carlão

A um bom tempo atrás fomos jantar em um restaurante dentro de um shopping. Na ocasião já usávamos alianças de compromisso e ao percebê-las em nossos dedos o garçom se afastou, foi em direção a um outro colega, cochichou algo e fez um sinal para o outro mostrando as aliança, ambos riram e servimos de motivo para o deboche, mas ao perceber que eu os olhava com a minha habitual cara de poucos amigos, ficaram sem jeito e trataram de continuar a atender as demais mesas. Esse relato não é de longe o mais sério que eu e tantos outros amigos LGBTQIA+ temos para contar. Cada dia é como combater um leão. Penso até que ainda tenho muita sorte por apenas ser alvo de piadas, enquanto muitas outras pessoas sofrem ataques físicos e são desrespeitadas inclusive dentro das suas próprias casas. Pensando um pouco nessa questão trouxe um filme nacional que estreou agora no mês de novembro no Amazon Prime Vídeo: “Carlinhos e Carlão.”

Pense em um filme cheio de clichês… sim abarrotado deles e inclusive com direito a performance do clássico “I Will Survive”, mas “Carlinhos e Carlão” tem um valor inestimável por tocar o dedo na ferida da nossa sociedade Brasileira, extremamente preconceituosa, que de estar tão acostumada a agir dessa forma, acredita realmente que exista um padrão normal/moral/social a ser seguido por todos.

Carlão (interpretação convincente de Luis Lobianco) é o típico MHE (Macho Hétero Escroto), mas ele não tem realmente culpa de ser como é. Carlão é fruto da sociedade preconceituosa na qual ele nasceu e cresceu. Carlão é vítima de uma família que ensina aos seus filhos que ser diferente é errado e que gera preconceitos que permanecem entranhados em seu ser. Junto com seus amigos Cadinho (Marcelo Flores), Zeca (Saulo Rodrigues) e Antunes (Pedro Monteiro), formam o típico grupo de pessoas que perdem o amigo, mas não perdem a piada. Sempre extremamente machistas e homofóbicos. Trabalham em uma concessionária e dividem o seu tempo livre entre os jogos de futebol na quadra do bairro e encher a cara no barzinho.

Certo dia Carlão precisa de um novo guarda-roupa e acaba entrando na loja de móveis usados de Evaristo (Luis Miranda) que, ao ser maltratado por Carlão, o tranca em um armário mágico e acaba por fazer um favor para a sociedade. Óbvio que você, querido leitor, já consegue imaginar que lá de dentro só poderia sair Carlinhos, o alter-ego homossexual de Carlão que passa a assumir o controle ao cair da noite.

Carlinhos é alto astral, divertido e não pense que você e o público em geral irá rir de Carlinhos, pelo contrário, todos iremos rir com Carlinhos, exatamente por ele ser um personagem leve, inteligente e que gera amor ao seu entorno.

Apesar de um enredo por vezes fantasioso, o filme apresenta pontos altos para discussões, como o respeito para com todas as pessoas e as suas singularidades, a violência nas agressões, sejam elas verbais ou físicas, e o embate de gerações, perfeitamente apresentado pelas discussões na mesa de jantar entre o sobrinho de Carlão, com uma visão moderna e sem preconceito da vida, e a família retrógrada. Claro que a abordagem dada para esses assuntos poderia ter sido melhor desenvolvida no filme, mas acredito que já seja um excelente pontapé inicial para que outros filmes possam trabalhar de melhor forma. Precisamos discutir mais sobre representatividade e “Carlinhos e Carlão” foi uma comédia necessária no cinema nacional nesse momento. O filme foi dirigido por Pedro Amorim, também conhecido pela direção da comédia “Divorcio” com Murilo Benício e Camila Morgado.

Sobre o final do jantar lá do início do texto, eu apenas tive uma conversinha rápida com o gerente sobre instruir melhor os seus funcionários.

Ficha Técnica: Carlinhos e Carlão

Título original:  Carlinhos e Carlão
Direção: Pedro Amorim
Elenco: Luis Lobianco, Thiago Rodrigues, Suzy Brasil, Luis Miranda
País:  Brasil
Gênero:  comédia
Ano de produção: 2018
Duração: 93 minutos
Distribuição: Paris Filmes
Assista no Amazon Prime

Poster do Carlinhos e Carlão

TRAILER:

Por Alexandre Stábile
para a coluna Meu Mundo na Tela.

Fotos: Divulgação

2 respostas

  1. Confesso que o medo de encontrar uma história desrespeitosa me afastou de assistir a essa obra. mas seu texto foi mais que revelador, mostrou que há um sentido no filme. Obrigado, amigo!

  2. Parece ser divertido também, além de trazer as reflexões de praxe,como sempre vc escreve de modo leve e descompromissado, sem a obrigatoriedade crítica, aguçando a curiosidafe do público.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *