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Diva da Administração Pública

Pierre Rinco

Desça do Muro

Olá, Little Divos, como estão?

Espero que bem! Eu estou belíssima, poderosa, arrasante! Estou toda Aretha Franklin lançando álbum novo! Mais requisitada que sites de compra da China! Tão elegante quanto minhas amigas servidoras públicas que comemoraram o Rosh Hashaná (o ano novo judaico) este mês, com direito às maçãs regadas a mel! Ou seja, estou sambando.

E quero realmente sambar hoje. Sapatear. Mandar um colar de beijos para as inimigas. Petrificar as inimigas e guardá-las em cem matryoshka – para quem não conhece, são bonecas que são colocadas umas dentro das outras – que trouxe comigo em minha última viagem para Moscou, na primavera cálida do ano retrasado.

Como farei isso hoje, Little Divos?

– Ai, Diva, já sei: você vai detonar uma inimiga? – questionou minha amiga Katlyn Eduarda.

– Diva, tenho certeza que você fará isso lacrando ortograficamente uma inimiga! – questionou minha amiga japonesa Sokome Missoshiru – aquela que é quase uma gay.

– Ai, Diva, estamos ansiosos! Fala logo! – rapidamente bradou meu fã clube.

Está bem, calma, pessoal! A Tia Diva da Administração Pública vai explicar como o farei: em nosso texto deste mês, contra as inimigas, quero sambar na cara das… AMIGAS! Isso mesmo, das amigas. E amigos. E pretendentes a amigos. E pretendentes a namorados, maridos ou de qualquer parte da minha vida.

Explico:

No dia 10 de setembro, João Antônio Donati, que tinha apenas dezoito anos, foi assassinado. Seu pescoço e suas duas pernas estavam quebrados. Sua boca, após a morte, foi preenchida com papeis nos quais se liam frases como “Vamos acabar com essa raça maldita de demônios (gays)”.

Não é o primeiro caso, infelizmente não será o último motivado pela homofobia, pelo discurso contínuo de bestiais figuras que se escondem no esgoto da civilização humana como Levy Fidélix, candidato à presidência – que, graças a Deus, em todo seu amor e glamour, não concede a este calhorda, misógino, mentecapto, quase um platelminto ambulante, mais do que meia dúzia de votos – que protagonizou, no debate eleitoral exibido pela Rede Record no dia 28 de setembro, uma cena homofóbica e depreciativa da dignidade humana. E, com chorume nazista saindo pela boca, o candidato conclamou as pessoas a “enfrentar essa minoria”, ou seja, os gays.

Pois eu, a Diva da Administração Pública, lanço aqui este manifesto: o DESÇA DO MURO!

Desafio cada pessoa que tem um amigo, familiar e conhecido homossexuais a apoiá-los e apoiar a causa dos direitos LGBT. E não só apoiar na surdina não! Quero que os defenda nas rodas de bar, nas conversas de futebol, nas reuniões de família, nas redes sociais, no culto, na missa, onde quer que necessite, de forma aberta.

Desafio vocês a descerem do muro, de tomar um lado: o  do Amor. Desafio vocês a serem amigos de verdade. Pois quem nada faz consente com a perversidade desses homofóbicos. Fazer nada, como se tem feito e visto por aí, é dar suporte e ser cúmplice a todos os crimes cometidos no país em virtude da orientação sexual das vítimas. Não deem risada de preconceito. É assunto sério, não é piada. Não compactuem com a violência. Chega de dor, chega de mortes.

Não tem jeito de vocês almoçarem com um amigo gay e tomar cafezinho com um homofóbico. Tome
sua posição. Decida seu lado. Desça do muro. Amigo de homossexual calado diante um preconceito, dando graça ao homofóbico? Meu Deus, isso me ira! Eu me sento em minha poltrona francesa em casa e penso que isso é um absurdo! Bando de FARISEUS! É tempo de descer do muro, bater o joelho no chão e orar a Deus, pedir ao Senhor que ofereça esclarecimento aos preconceituosos e coração firme e revolta aos homossexuais. Por isso eu conclamo: sejam potência nas mãos dos direitos humanos, senão vocês serão potência nas mãos dos racistas, machistas, homofóbicos e fundamentalistas.

E desafio a comunidade LGBT a não se contentar com migalhas. Não aceitem menos do que isto de seus amigos. Excluam sem medo da sua vida aqueles que não lutam por seus direitos e não assumem sua bandeira! Quem perdem são eles! Quem ganha é você, um imbecil a menos em sua vida, ao seu redor.

Desafio vocês a exigirem dos seus próximos e de quem lhe ama suporte de fato. Vocês não precisam de aceitação, Little Divos; a opinião e aceitação das pessoas vale menos que uma bolsa imitada da Louis Vuitton da 25 de Março. Vocês precisam de direitos, de não interferência, de respeito, viver sua vida com amor, carinho e igualdade de oportunidades.

Desafio vocês a cortarem laços definitivamente com quem compactua com preconceito. Com quem não luta pelas suas lutas. Que amigo é este, que não seca suas lágrimas? Que amigo é este que não sabe o que você passa, o ódio que enfrenta por simplesmente existir?

Eu já entrei no desafio. Afinal de contas, a Diva da Administração Pública é amor, é pluralidade, é virtude. A Sokome Missoshiru entrou também, mais do que eu, afinal de contas, ela e sua sobrinha Gyoza Noshoyu já são quase mulheres heterossexuais gayzorcizadas. Eu já excluí do meu facebook pessoas que apoiaram o discurso do Fidélix, do Malafaia, do Feliciano. E vocês, o que farão? Nada?

É tempo de atenção, Little Divos, vamos olhar para a história. Todas as vezes em que a coletividade alcançou níveis maduros de liberdade e respeito, vieram período de trevas: foi assim com a Primeira Guerra Mundial, a Segunda Guerra Mundial, a Guerra Fria, as ditaduras militares na América Latina. Prova disto é que o Congresso eleito no pleito ocorrido em 4 de outubro é o mais conservador desde 1964, primeiro ano de DITADURA MILITAR no Brasil. Vocês leram bem o que acabei de dizer? Que atualmente, em pleno exercício democrático, estamos tão tiranos quanto fomos no período de repressão militar, aumentando a participação de militares, religiosos fundamentalistas e ruralistas nas bancadas das casas legislativas.

Atualmente, a população LGBT, as mulheres, os negros e outros grupos que sofrem opressão conquistaram muitos direitos, ou seja, eu sinto em minha alma de administradora pública e diva mundial que tempos difíceis se aproximam. O conservadorismo fala cada vez mais alto por meio do fundamentalismo religioso, do racismo das torcidas, das comentadoras de telejornais, humoristas que não possuem nenhuma graça, dos conflitos no Oriente Médio, da violência policial, da ultra direita novamente elegendo-se na Europa. Cada dia que passa os conservadores e as pessoas contra os direitos humanos estão tomando seu lado, falando mais alto, esquecendo as atrocidades que euzinha vi nas Guerras e na Ditadura Militar brasileira. Vocês querem que tudo aconteça novamente?

Nós, que representamos os direitos humanos, temos que assumir nosso lado, descer do muro. Quando as trevas chegarem, quero saber com quem poderei contar de verdade. E vocês, comunidade LGBT, podem contar eternamente comigo, a Diva da Administração Pública, que acabei de cumprir meu papel e descer do muro, trabalhando ativamente pela comunidade.

Para os outros, do lado de lá do muro, desejo apenas vida longa para ver nossas vitórias e que, acidentalmente, caiam sobre um estojo imenso de maquiagem da MAC que entrará no aparelho excretor não-reprodutivo de vocês.

Beijos públicos a todos vocês, little divos! Até a próxima.

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