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A arte do momento

O momento de um raio caindo do céu e o tempo livre do outro lado casa.

Tenho pensado muito sobre o apego que temos às coisas, aos sentimentos e como isto nos leva ao sofrimento por estarmos presos no passado ou, às vezes, no futuro. Vem da sabedoria dos nossos amigos orientais que a vida é fluida e impermanente, tudo inevitavelmente se vai e é inconstante. Há dias de sol e há dias de nuvens carregadas e tudo isto faz parte de um ciclo necessário e de muita importância.

Assisti recentemente um drama chamado “Tudo bem não ser normal” e nele o tema principal do enredo era justamente a superação de traumas e sofrimentos que passamos, sem deixar que isso domine a nossa vida e nos tire a coragem (e ousadia) de viver. Inclusive, já no primeiro episódio, a personagem escritora de contos infantis nos ensina através de seu livro: “Não se esqueça de nada. Lembre de tudo e supere. Se não superar será uma criança cuja alma nunca floresce”.

Isto não significa que você tenha que jogar sal na ferida e ficar remoendo, mas ocultá-las não resolve a questão. É um preceito da filosofia Kingtsugi, que significa ouro (Kin) e juntar duas peças (Tsugi) e diz respeito da beleza da imperfeição, uma metáfora das vidas humanas que vivenciam perdas e sofrimentos, tanto quanto as alegrias e satisfações. Trata-se de uma lenda de um antigo xógum que mandou suas xícaras para serem remendadas na China e, ficando desgostoso com a aparência tosca das rachaduras, mandou que seus servos preenchessem com ouro. Isto conferiu uma história e uma beleza única às xícaras. O fato é que as nossas dores podem e devem ser ressignificadas e nos conferir aprendizados e belezas que antes não tínhamos.

Repito: não devemos remoer as más lembranças, mas sim nos questionarmos: “Com o que estou preenchendo meu coração?”. Se a vida é um eterno ciclo de inconstâncias e impermanências, se tudo é energia que flui, tudo também é ressignificação. E se apegar aos sentimentos sem compreendê-los ou se apegar a pessoas e objetos e planos malfadados, é deixar que a vida ganhe um caráter duro, estático e frio, o que é o oposto do que de fato ela é e acarreta inevitavelmente em sofrimento.

A alegria está, portanto, na vivência do hoje e do momento. Cada coisa é sublime e bela por si e cabe a nós conferirmos a isto sua devida importância. Sabem aquela música de Beto Guedes?

“Abelha fazendo o mel / Vale o tempo que não voou […] No inverno te proteger / No verão sair pra pescar/ No outono te conhecer/ Primavera poder gostar/ No estio me derreter/Pra na chuva dançar”. É isso, viver cada momento como algo sagrado e entender que nada é para ficar.

Para ver mais textos de Raphaelly Bueno,
acesse sua coluna Contraponto

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Foto de Dave Morgan no Pexels

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