Minha brincadeira preferida na infância e adolescência não era pentear bonecas ou brincar de casinha como a maioria das meninas. Desde pequena minha paixão eram os jogos de tabuleiro (tinha dezenas deles), praticar esportes e atividades que envolviam movimento – polícia e ladrão, queimada, taco, seis corta, frescobol, vôlei de rua, futebol, paredão (criado apenas na escola que estudei), bicicleta, skate, rolimã, pipa, entre outros. Praticamente era a única menina entre os meninos que curtia radicalizar entre rodinhas. Na época era um tabu, mas nunca me importei e jamais houve impedimento por parte dos meus pais. Que sorte a minha!
No pátio do meu colégio havia um paredão inclinado, alguém teve a brilhante ideia de usar uma bolinha de tênis ou borracha e criar o jogo. Que durante anos, virou febre nos intervalos. A regra era a seguinte: formava-se uma fila e cada um tinha que bater com a palma da mão na bolinha e jogá-la no paredão. O próximo podia bater direto sem deixar pingar ou pingar apenas uma única vez no chão. O legal da brincadeira era jogar com força para dificultar a jogada para o próximo. Quem não conseguisse bater na bolinha e jogá-la de volta ao paredão, estava fora da partida e assim sucessivamente até a disputa ficar entre dois jogadores. Os intervalos na escola eram super disputados, éramos viciados.
Aprendi a jogar xadrez e dominó com meu pai e buraco com a minha mãe. Nossas noites de sexta e tardes aos finais de semana era praticamente um “cassino” familiar. Meu pai também me ensinou a fazer meu próprio papagaio (pipa). Adorava ir até a lojinha perto de casa comprar varetas, papel de seda colorido, cola, barbante e linha 10. A rabiola fazíamos com pedaços de saquinho plástico. No meu texto https://prodiversidade.org.br/almoco-de-domingo/ relato um pouco sobre esta passagem deliciosa no tempo.
Tive a sorte de viver numa época em que não éramos escravos da tecnologia. Aliás, tecnologia era praticamente inexistente. Tínhamos câmera fotográfica analógica, videocassete (tenho até hoje), rádio com gravador de fita K7 e o tão cobiçado ATARI. Esquecia até de comer para ficar jogando. Quem nunca teve cãibra na mão jogando Decathlon, não jogou direito (risos). Lembro exatamente quando ganhei da minha mãe uma agenda eletrônica e um Pager (Bip) aos quinze anos. Ostentação do momento!
Outra coisa que adorava usar era a máquina de escrever da minha mãe (óbvio que tenho ate hoje também) e não posso esquecer de mencionar o cheirinho agradável de álcool que saia do mimeógrafo da escola. Quem nunca rebobinou uma fita K7 com um lápis ou caneta, não viveu direito. Tem saudade dos anos oitenta?! Leia o texto https://prodiversidade.org.br/geracao-tubaina/.
Raríssimas pessoas tinham telefone em casa, era artigo de luxo. Sou da época em que o telefone sem fio era apenas uma brincadeira infantil. Nosso meio de comunicação à distância era o orelhão, ficávamos horas na fila de espera para usar, tínhamos que comprar fichas que duravam apenas três minutos para chamadas locais (algumas vezes o orelhão as engolia e não conseguíamos concluir a chamada). Somos uma geração de fofoqueiros por natureza, porque enquanto aguardávamos nossa vez na fila, ficávamos prestando atenção na conversa alheia. Pensa?! Os jovens de hoje nunca saberão o que isso significou para nós. Nós que nascemos na década de 70, acompanhamos toda transição tecnológica e isso ninguém nos tira. Vivência exclusivamente nossa!
Tenho a impressão que antigamente, mesmo sem “tecnologia”, era tudo mais legal, divertido, unido. As pessoas eram de verdade, não tinham frescura. Amo a simplicidade que vivemos naquele tempo. Tomar sorvete, no meio fio da calçada, rindo com os amigos até tarde da noite era uma preciosidade sem tamanho. Saudade de ficar horas na locadora escolhendo filmes, saudade do som da ficha caindo no orelhão, saudade de disputar o banheiro com meus irmãos antes da escola, saudade de dividir o quarto com eles, de ficarmos até de madrugada rindo e minha mãe brigando para dormirmos. Hoje tenho até saudade das brigas por besteiras que tínhamos. Saudade de um tempo que não volta mais.
Hoje não temos mais “surpresas desagradáveis” ao revelar fotos, não ganhamos “brindes” nos palitos de sorvete, não trocamos figurinhas, não ficamos horas esperando tocar nossa música favorita no rádio para gravar. Seguimos gravando apenas lembranças. Guardo as minhas numa “fita VHS” dentro do meu coração, assim, quando quiser voltar no tempo, rebobino lentamente a memória para que ela não enrole no meu “cabeçote” e estrague as recordações.