Os padrões nos cercam, em padrões, inclusive. Por onde olhamos, por onde circulamos, seja na vida diária, no trabalho, em meio aos afazeres domésticos existem medidas criadas por terceiros tentando determinar como devemos ou não nos vestir, andar, falar. Ou seja, temos que ser a imagem e semelhança dos critérios atribuídos a nós.
Não é diferente no mundo dos ursos. Além de existir os padrões heteronormativos, os quais dizem sobre como os homens devem ou não se comportar, existem também os padrões homoafetivos, que, apesar da diversidade, também estabelecem medidas – a contragosto, algumas vezes. No universo LGBT+ os ursos tem que ter cara, barba, barriga, braços, roupas, pelos e comportamentos de urso – ainda não sei ao certo o que isso quer dizer.
Tenho recebido desabafos de situações um tanto quanto peculiares. Tem que consumir bear style: se vestir com roupas ou adereços ursinos – cheiro de fetiche no ar; tem que comer churrasco e muita cerveja; pesar 130kg – de músculo; tem que ser divertido, acolhedor e ter muitas amigas, para o benefício delas; amar baladas e, por fim, as mídias sociais tem de mostrar os resultados do consumo de carboidratos e horas e horas de halterofilismo.
O problema não é nenhum dos aspectos mencionados acima, mas as exigências do cumprimento de todos eles para ser aceito no grupo. E se não conseguir cumprir todos os itens, não poderá, por acaso, praticar a vida ursina?! Intrigante contrato imaginário. A diversidade precisa ser realmente mais diversa. Se a vida nos impõe, muitas vezes, limitações por causa de nossas orientações, escolhas e identidades, por que deveríamos passar por isso dentro da nossa intrépida fauna?
O interessante é que no mundo do trabalho a coisa muda, mas somente sobre alguns aspectos. Primeiro, não existe a exigência de fazer uma reunião para que os colaboradores anunciem publicamente sua heterossexualidade. Não lembro de ver tapinhas nas costas e congratulações por isso. Mas, no mundo LGBT+ o anúncio precisa ser feito (?). Essa diferença revela o quê?
No universo dos ursos, é chocante. Geralmente homens grandes, másculos, bem vestidos, “se perdem” por não serem os padrões de masculinidade esperado, dentro dos critérios heteronormativos. Passam a ser visto como suporte emocional; medida de risos e piadas ácidas; precisam a partir deste momento serem a alma da festa. Tudo, agora, tem de ser rosa – não por opção.
Como gostaríamos de ser reconhecidos no ambiente de trabalho? Sempre que me faço essa pergunta imagino que a resposta tenha relação com as capacidades intelectuais e profissionais, de cada um, para resolver problemas inerentes à dinâmica diária do ofício realizado. Como, de forma simplista, obedecer cegamente a padrões exteriores farão que nosso desempenho profissional pura e simplesmente se multiplique?
Não sei até que ponto se faz necessário ter que anunciar em outdoor nossas preferências, particularidades, orientações e identidades – me refiro, claro, a revelação no sentido da obrigação pública. Já relataram para mim casos de verdadeiros constrangimentos no trabalho, quando o supervisor veio parabenizar um urso por “sair do armário”. Em primeiro lugar, o relato veio de alguém que nunca esteve neste armário. Em segundo, ele não estava fugindo da polícia. Na verdade, estava apenas sendo discreto – isso não é crime. Afinal de contas, somos obrigados a revelar aspectos da nossa vida sexual, agora?
Ou seja, nosso concidadão foi exposto a uma situação a qual ele não desejava. E, por isso, mudou a forma de ser tratado no ambiente profissional. O aspecto sério inerente ao seu cargo se transformou no ombro amigo que entende tudo e todos – inclusive os erros. Não era essa sua meta profissional. Acredito que precisamos refletir um pouco mais sobre como cada um lida com o seu universo pessoal..