A todo o momento temos nos deparado com o quanto a verdade não vale nada na boca de quem ele deveria valer muito. Estou falando de nossas personalidades da política. Isso está muito estabelecido na história da política brasileira, mas nunca como agora, nós temos encarado as coisas assim. Inegavelmente, a mentira de nossos governantes tem custado muito, porém a que preço? Precisamos saber mais, ter uma postura diferente com relação à mentira, pois isso nos tem custado vidas.
No passado do passado
Primeira verdade questionável do passado: independência. Nunca fomos governados por uma classe que usasse da verdade como premissa. Nossos primeiros governantes eram portugueses e seus criados. Saímos de uma situação de colônia para sermos governados por herdeiros dela. Portanto, fundaram um império. Um filho do rei virou imperador aqui. Era o início de uma curta, mas marcante dinastia aristocrática, branca e descolada da realidade do país. Sua grande mentira: progresso e liberdade. O país não se viu livre da escravidão, assim como não se viu livre de da dependência europeia. Uma nação enorme, cheia de recursos e riquezas, no ápice do capitalismo do século XIX. No entanto, o Brasil era um mercado para manufaturas inglesas.
Segunda verdade questionável. Democracia. Veio, então, a república. Não mudou muito. Uma burguesia branca entrou no poder que já era deles. Livraram-se apenas de uma família real incômoda, luso-brasileira, arrotando grandezas de purificação. Isabel de Bragança aboliu a escravidão, saiu de cena, caiu o pano e os antigos escravos foram abandonados à sorte de uma classe branca que os odiava, mas dado o número dos negros daqui, não conseguiram suplantá-los com genocídio.
Nessa época, se inaugurou o ódio pelo negro, pelo preto, pelo cidadão de segunda classe, todos os mestiços, quer tenham tintura por serem de origem indígena ou afrodescendente. A grande massa do Brasil tem pele escura. Aqui brancos são minoria e são a maioria nos postos de maior poder. Branco tem privilégio até quando é mais pobre. A cultura a mentira criou isso.
Verdades questionáveis do século passado
Nossa nação nasceu da mentira. Desde o início, nossa república nunca foi democrática, mas baseada no poder do dinheiro. A prova disso é que para se votar, depois de 1889, tinha que se comprovar renda. Até que pobres e mulheres pudessem votar, quase meio século. Depois disso, quarenta anos depois da república, uma ditadura de quinze, depois uma democracia cambiante, mais 21 anos de ditadura, até a década de 1980 do século passado. Ou seja, andamos um passoa para frente e três para trás, durante quase um século.
A nossa nova democracia nasceu de uma Constituição Federal burguesa. Por mais que seja benéfica, tende a proteger a propriedade individual e a privada, não permitindo a socialização de meios de produção. Portanto, não adianta querer que trabalhadores sejam donos de seu trabalho. Não somos, aliás, somos submetidos a regimes de uso de nossos corpos numa economia que torce as leis. Isso tudo para que trabalhemos cada vez mais.
Nenhuma verdade é mais questionável do que a liberdade, a igualdade e a fraternidade na Terra Brasilis. Mas precisamos de acreditar nisso, porque somente assim poderemos tomar para nós a narrativa da verdade que está na mão de políticos e governantes. Eles mandam em tudo e é por meio da opinião deles que vemos as coisas. Não nos perguntam o que está certo, o que queremos. Os nossos governantes costumam decidir nossos destinos. Se eles são bons, sorte. Se não são, revés.
Hoje em dia
Um espetáculo dantesco de mentiras inquestionáveis desfilam no Senado brasileiro com a Comissão Parlamentar de Inquérito que investiga a ação do governo no combate à pandemia. Assistimos diariamente pessoas relacionadas ao governo a mentir descaradamente, porque governam baseados em mentiras. Assim como foram eleitos com mentiras, fake news, factoides e loucuras paranoicas. Assistimos, portanto, a um desfile de monstruosidades ditas no lugar das verdades questionáveis da nossa democracia.
Por um lado, nosso governo democrático se assemelha a uma ditadura, porque não respeita a verdade, a ciência, a vontade do povo. Por outro, provoca a morte por negligência e tenta esconder isso de maneira ridícula. Quase 450 mil mortes registradas, portanto não dá para varrer debaixo do tapete, como varreram os mortos da Ditadura de 1964. Ou as falcatruas da década de 1980, ou a fome e recessão dos anos de 1990.
Mas por que chegamos onde estamos? Há teorias em curso, a história não se escreve tão rápido. Eu tendo a achar que três mandatos de meio de um governo social-democrata de origem proletária pode ter gerado ciúmes da classe burguesa no país. Mas isso tudo é muito simplificador. Há muito a se pensar quando se trata do futuro de uma nação. isso nunca é problema de uma classe só. Assim como não é problema de apenas uma nação. Portanto, é um problema complexo que envolve entrelaçamento de poderes.
Pensemos. Que verdades questionáveis ainda vamos tolerar? E que mentiras nos farão fingir de surdos?
Capa do artigo: Image by Fathromi Ramdlon from Pixabay
Por Alex Mendes
para sua coluna O Poder Que Queremos