Poema para Vicente Maiolino

Na última vez em que vi Vicente
ele vinha no bonde
que desce Santa Teresa.

Ele desceu no centro.
Ponto final ao lado do prédio
da companhia de petróleo.

Não havia pré-sal ainda.
Havia camadas de memória
do tempo em que dividíamos
apartamento.

Na última vez em que vi Vicente
fiquei de costas para ele.
Não sei se ele me viu, se me reconheceu
ou se esqueceu dos anos 80.

Depois, soube dele morto.
Assassinado por 12 tiros.

Na última vez em que vi Vicente
ele ainda não era feito Mineirinho.

Foi morto empiricamente,
mas foi meu descaso
que apagou em mim a memória dele.

Um só esquecimento seria suficiente
para dar fim ao Vicente,
mas foram 12 os desejos de
esquecê-lo, daquele tempo.

Na última vez em que vi Vicente
declamava Drummond com Carolina.
Reclamava do tempo que esquece da gente.

Na última vez em que vi Vicente
a lua era o amor de minha vida,
a barca do inferno em que delirantes
se banham de luz.

Depois, soube dele pelas tintas dos jornais.
Sangue na calçada em frente à casa em que morava.

Na última vez em que vi Vicente
tinha todos os dentes na boca.
Vicente era Maiolino, raio lindo
maio lindo do teatro mambembe.

Foto de Capa Divulgação (peça “A idade do sonho”, em que dirigiu, atuou e recebeu muitos prêmios)