Dia 16 de Setembro o Facebook me lembrou que 10 anos atrás eu participava do meu primeiro protesto contra o assassinato de LGBTs.
Duas mulheres trans e um menino gay haviam sido mortos com requintes crueldade devido ao preconceito.
Até hoje me lembro principalmente do caso do menino, João Donati, que foi encontrado morto num terreno baldio com um papel na boca escrito “tem que acabar com essa raça”, mas a polícia descartou motivação homofóbica no crime.
Não sei como.
Lembro que quem participou fez uma roda no Largo do Arouche, onde todos deram as mãos falaram o nome de cada LGBT morto naquele período, para cada nome falávamos “presente” como se fosse uma chamada de escola. Algo que vi se repetindo outras vezes em outros protestos contra violência e que chega ser brutal na forma como demarca a ausência daquela vida perdida.
No dia tive o prazer de ver o jornalista Neto Lucon pela primeira vez, fazendo um excelente trabalho numa época que noticiar essas coisas era ainda mais incomum e lutando com todas as formas para cobrir essas noticias da nossa população tão invisibilizada para o finado site NLucon.
Também tive o desprazer de saber q enquanto a família de João Donati buscava por justiça o agora inelegível ex-presidente estava tirando sarro da situação, querendo encaixar aquele crime de ódio na categoria de crimes passionais para divulgar um projeto de lei que ele havia criado um tempo antes. Uma forma de algo mesmo tempo negar a motivação homofóbica do assassinato e se promover como político injustiçado ao mesmo tempo, já que tratar um crime de ódio como passional era um extremo escárnio.
O que consigo avaliar é que 10 anos depois as coisas estão um pouco melhores.
Teve uma diminuição de 326 mortes por LGBTfobia em 2014 para 230 em 2023, além disso alguns direitos civis foram garantidos, oficializados ou, no mínimo, encaminhados para uma resolução.
Mas ainda está longe do ideal.
Há relatos de assassinatos em série em São Paulo e de assédio institucional e político contra estabelecimentos direcionados ao público LGBT que funcionam a décadas na cidade, ameaçando fechá-los mesmo com todos os alvarás de funcionamento em ordem.
Também há uma crescente utilização de ataques contra pessoas trans como forma de trampolim político, visto que é uma população ainda mais vulnerável que os gays e lésbicas e com menos gente disposta a ouvir e acolher.
Não vamos e nem devemos esquecer os que se foram, que caíram para a violência, para o descaso institucional, para as epidemias que atingiram nossa comunidade e o mundo mais de uma vez.
Também não devemos esquecer de todas as nossas vitórias, mesmo que pequenas, de como as letras LGB estão quase com a garantia de direitos plenos, e como mesmo que aos poucos a letra T e o resto da nossa querida máfia do alfabeto estão conquistando direitos e visibilidade.
Ainda temos muito o que caminhar até chegar numa realidade onde todos possamos enfim só aproveitar a vida, sem nos preocupar com intolerância, ódio ou preconceito.
Onde enfim a gente deixe de ser uma minoria discriminada e possa ser só cidadão com plenos direitos, tal qual era pra ser desde o começo.
Vamos seguir lutando, pois num mundo doido como esse, seguir existindo já é uma vitória.
Foto tirada por Neto Lucon em 09/2014.