Eurocentrismo Danoso

Nós somos um país colonizado por países diversos da Europa, como Portugal, Espanha, Inglaterra, França e Holanda. Essa invasão desses países ditaram as regras dos nossos costumes, dentre eles a arte e cultura. Logo, é de se esperar que tenhamos uma herança cultural desses países. Como eles eram dominantes, recebemos tudo por imposição. Porém, isso não nos impediu de recebermos outras heranças culturais vindas de grupos oprimidos, como dos tantos povos do continente africano como Moçambique, Angola, Ruanda, Senegal, Congo dentre outros, além da cultura herdada dos dizimados povos indígenas. Cada grupo que tivemos contato contribuiu de alguma forma para a nossa bagagem cultural e por isso temos uma diversidade artístico-cultural tão rica. Porém, quero lembrar que os sistemas educacionais foram ditados pelos grupos dominantes. Assim sendo, fomos acostumados a entender que tudo que veio da Europa é bom e superior e tudo o que é não europeu é ruim e condenado. Mas, será mesmo assim? Um exemplo disso é a famosa diferenciação entre arte e artesanato. Arte é bom, imita os modelos europeus, é rico, é puro. Aquilo que não segue os modelos da Europa são rebaixados a simples artesanato. Existe um movimento muito importante focado na descentralização europeia da cultura e da arte. Nas tantas tentativas (é muito difícil, afinal fomos educados assim), uma solução um tanto segregacionista foi chamar a arte que não imita a do velho mundo de arte étnica ou arte exótica. Mas não somos exóticos. Não somos étnicos. Na verdade todos nós somos étnicos. Eles também são, fazem arte de gente branca e rica.

É importante mantermos isso em mente quando formos criar nossa arte. Eu possuo uma herança europeia e minha arte vai refletir isso, mas eu posso buscar receber as influências da minha cultura originárias de outras fontes de influência. O que eu ganho com isso? Tudo. Serei autêntico, serei fiel às minhas raízes ao invés de valorizar apenas uma parte de minhas origens. Outro argumento corriqueiro é dizer que a música/arte de tal povo é pobre ou simples demais. Ora, existem tantas obras europeias simples e pobres quanto em qualquer outra cultura. Entenda pobre como obra com poucos processos criativos (o que é diferente de ser ruim). Mesmo assim, para combater essa padronização “superior”, é preciso saber argumentar bem com fundamentos. Simplesmente afirmar que Bum Bum Tam Tam é mais complexo do que Bach, por exemplo, porque aquele não pode ser escrito em partitura, é um argumento um tanto falho. Vamos reconhecer a preciosidade que existe em cada obra, mas colocar cada qual em seu lugar.

Johann Sebastian Bach morreu em 1750. Sua obra atravessou o século XVII e metade do século XVIII. Nesse tempo era usado um sistema de notação musical adequado para a música daquela época (diferente da notação de hoje, que já evoluiu bastante). A música do período barroco era feita para castelos e igrejas, em salas e salões com tratamento acústico de reverberação pela arquitetura da época e isso influenciou diretamente na produção musical da época.

Bum Bum Tam Tam é uma obra de funk brasileiro do século XXI. Um período em que o aparato tecnológico permite muitos outros efeitos sonoros por causa da música eletrônica e síntese sonora. Existe um sistema de notação musical específico para música eletrônica, ou seja, ela pode ser escrita em partitura, sim. Mas não é a mesma de Bach, é outra, a de música eletrônica e síntese sonora. Nela tem os desenhos dos knobs com as posições do grave, médio, agudo, tipo de onda, phase, distorção etc. Logo, é inadequado querer comparar e quantificar uma obra de um período, país, etnia, classe social com outra totalmente diferente. Vamos ser coerentes e não cometer o mesmo erro que os europeus nos tratam. Eu quero deixar claro que NÃO existe música superior, mas músicas diferentes. Todo gênero, toda época, toda tradição são bem-vindos. É música. Simples assim.

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Abraço musical

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