Diva da Administração Pública

Diva

Aniversário Ensurdecedor!

Olá, Little Divos, como estão?

Eu estou ótima! Neste mês eu fiz aniversário, mais precisamente no dia 25 de junho! TODOS OS SERVIDORES PÚBLICOS GRITAM: UOOOBAAA!!! Fui recheada de presentes: sabonete líquido, óleo de banho e gloss com fator natural de caramelo e chantilly – uma verdadeira delícia, meus amores, dá uma imensa vontade de morder a mim mesma – máscara de pepino, gel de limpeza profunda para o rosto, máscara de argila verde e hidratante babadeiro, entre várias outras coisas.

Amei cada presente que ganhei. Tudo luxo, tudo glamour, tudo sedução. Fiquei muito contente também com todas as mensagens de carinho que recebi de meus fãs, tanto pelo Facebook quanto pessoalmente, aqui na repartição. Em todas as mensagens, meus fãs me desejavam uma vida maravilhosa, afinal de contas, eu merecia, bem como desejavam que eu continuasse divando sempre!

E eu mereço mesmo gente. Tantos anos dedicando minha vida pelo Estado e pelo bem de todos, é tão gratificante saber que todos reconhecem minha graça, divandade e competência para o setor público Brasileiro. Até uma festa surpresa eu recebi, extremamente carinhosa e que tinha um bolo de dois andares, meu bem! E não é que a festa foi organizada pelas minhas amigas divônicas Katlyn Eduarda e pela japonesa Sokome Missoshiro – aquela que é quase um gay. Pois uma diva da administração pública como eu não poderia passar seu dia sem uma surpresa tão linda como a que me fizeram. Obrigada por tudo, vocês coloriram meu dia.

O único fato que ressalto para vocês é que estou com uma sequela da dengue que contraí em Paris há dois meses. Minha audição do ouvido esquerdo, o mais divônico, está prejudicado em virtude de uma otite média diagnosticada. Espero melhorar logo e que seja reversível. De toda forma, lembrei-me de como eu fui feliz quando estudava e era fluente LIBRAS – A Língua Brasileira de Sinais. E queria sapatear na cara dos que tem preconceito com os surdos, ainda hoje.

Eu mesma já ouvi chamarem surdos de “surdinho”, “louquinho”, “surdo-mudo” e “deficiente”. Little Divos, vamos pensar um pouquinho? Vocês percebem o quanto estes refletem o cruel preconceito da sociedade, que considera o surdo como pessoa passível de tratamento, que deve se sacrificar para conseguir encaixe numa cidade feita contra ele? Espero que sim, ou, do contrário, vou traduzir em LIBRAS a música Ragatanga na cara de cada ouvinte preconceituoso que estiver por aqui!

Chamar o surdo de “surdinho” é tentar deixar o termo no diminutivo para que ele se torne “aceitável socialmente”, tática pseudocarinhosa (e, na verdade, profundamente perversa) em busca de justificativa para a surdez, ao mesmo tempo em quedenota piedade com relação ao surdo, como se ele fosse digno de piedade, de pena, de compaixão.

É a mesma coisa de eu dizer que o tailleur da moça do quarto andar da minha repartição pública está “caidinho”, “elegantezinho”, “arrumadinho”. Ou que o bumbum daquela chefe de setor do terceiro andar está com “um pouquinho de celulitezinha”, quando, na verdade, a aparência daqueles buracos lembra a superfície da lua. Não é elegante. E não sou só eu quem está dizendo isto, Little Divos: Gloria Kalil, minha amiga, e Costanza Pascolato diriam a mesma coisa. Respeito é padrão de elegância.

E quando ouço alguém chamando o surdo de “retardado” ou “louquinho”? Quem fica louca sou eu, que vontade que dá de sapatear com meus Louboutin na unha do dedinho do pé da pessoa. Quando há o uso destas alcunhas, estabelece-se o raciocínio embutido e errôneo de que todo surdo também é paciente psiquiátrico. Evidentemente, o surdo pode ter algum distúrbio psiquiátrico, como qualquer pessoa. No entanto, o que leva as pessoas à confusão entre os distúrbios e a surdez é o fato de que a sociedade não é capaz, ainda, de lidar com a diversidade e pelo fato de as diretrizes pedagógicas não serem inclusivas nas escolas.

Imaginemos uma criança surda na escola, meus amores: seis horas por dia, presente em aulas de química, física, biologia, matemática e português, tendo que absorver o conteúdo de temas abstratos e concretos, numa metodologia de aulas baseada fala “oral” do professor, tentando interação social com todas as outras crianças. Se não há estímulo à LIBRAS e à inclusão na escola, em grande parte dos casos, esta criança será ridicularizada pelos outros alunos, fadada à estigmatização social. E isto não pode acontecer.

Passemos, agora, para a análise do termo surdo-mudo, Little Divos. Este é outro preconceito contra os surdos, pois apenas a minoria dos surdos é, também, muda. Deve-se levar em consideração que a mudez é outra condição, que independe da surdez. Os surdos, mesmo os que já nasceram surdos, se estimulados por exercícios de fonoaudiologia, conseguem falar. O que acontece é que nem todo surdo possui acesso aos serviços de saúde especializados em fonoaudiologia, que são, em média, caros e inacessíveis para grande parte da população. Ao surdo que não possui recursos para o tratamento adequado, falta-lhe o exercício, e, portanto, ele nunca fala. Óbvio, não é, meus amores?

Para terminar minha Dança Flamenca na cara de vocês, quero falar sobre o termo “deficiente”. Quando se considera a pessoa surda como deficiente, pressupõe-se que ela tem algo a menos, uma perda, uma vitimização própria advinda de sua  condição, que deveria ser “sanada/curada” para que o “deficiente” voltasse a ser como as pessoas “comuns”.

Que arrogância, gente! Nada elegante. Pois nada falta ao surdo: sua condição de não-ouvinte o impede de ouvir a língua falada, mas não lhe impede a comunicação. Desta forma, qualquer espécie de déficit advindo de sua impossibilidade de ouvir é transposta pela língua visual, no caso brasileiro, pela LIBRAS. Em outras palavras, não há deficiência. Há apenas a diferença. Não vamos ignorar a construção destas pessoas, Little Divos. A surdez não é uma ausência, mas, ao contrário, é parte fundamental da personalidade e cultura da pessoa surda.

Alfabeto em libras

No fundo, amores, deve-se ter em consideração que o ser humano é grandioso demais para ser enquadrado em caixinhas, complexo demais para ser classificado. Qualquer denominação dada aos surdos restringirá, como restringiria qualquer pessoa ouvinte, a amplitude e divindade de sua personalidade, de suas crenças, de suas felicidades, de suas tristezas. À vida, não cabe simplificação, só se cabe vivê-la.

Este é meu recado da vez, corram para o curso de LIBRAS mais próximo e matriculem-se, eu considero isto um dever para qualquer cidadão. E para os funcionários públicos o conselho vira quase uma questão emergencial: como dizer que se ouve o usuário dos serviços públicos se você, servidor, não consegue nem se comunicar com todos? Assim, vocês serão como eu:

Arrasei, não é?

Beijos públicos a todos vocês, Little Divos!!

Amo vocês.

Até a próxima.

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