O diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA) em uma criança muitas vezes marca o início de um profundo processo de luto e transformação para os pais ou cuidadores. Inicialmente, há uma quebra abrupta das expectativas e sonhos que tinham para o futuro do filho. Muitos pais imaginam uma trajetória de vida típica, repleta de conquistas convencionais e marcos previsíveis. Quando essas expectativas são confrontadas com a realidade do diagnóstico de TEA, surge um período de negação e dor, onde os cuidadores precisam assimilar e aceitar a nova realidade.
Esse processo envolve não apenas o luto pela perda das expectativas, mas também a reestruturação delas de acordo com as necessidades e capacidades da criança. É uma jornada emocionalmente desgastante, onde os pais precisam se educar sobre o autismo, aprender novas formas de comunicação e lidar com os desafios comportamentais que podem surgir. A aceitação gradual do diagnóstico permite que os pais vejam seus filhos não pelas limitações, mas pelas potencialidades e singularidades que cada um possui.
Com o tempo, a dor inicial se transforma em uma busca por recursos e apoio. Os pais aprendem a celebrar pequenas conquistas que antes poderiam passar despercebidas e encontram um novo sentido de esperança e propósito. As expectativas mudam, mas não desaparecem; elas se adaptam para incluir novos objetivos que valorizam o bem-estar e a felicidade da criança acima de tudo. Esse processo, embora doloroso, muitas vezes fortalece o vínculo entre pais e filhos, criando uma rede de amor, paciência e resiliência essencial para enfrentar os desafios e celebrar as vitórias do dia a dia.
Sem comparações
Quando descobri que meu filho era autista, minha vida mudou completamente. O diagnóstico trouxe um misto de emoções e uma necessidade urgente de reavaliar todas as expectativas que eu tinha para o futuro dele. Antes, eu inconscientemente comparava meu filho às outras crianças da mesma idade, mas isso mudou. Passei a celebrar cada pequena evolução dele com uma alegria imensa e genuína. Cada conquista, por menor que fosse, se tornou uma festa em nossa casa.
Eu e o pai dele nos emocionávamos a cada nova palavra dita, a cada novo movimento que ele aprendia. Essas pequenas vitórias se tornaram nossos maiores tesouros. Uma das maiores celebrações que tivemos como pais foi o desfralde. Foi um processo lento, que durou quase um mês. Para uma criança típica, o desfralde pode levar de 2 a 7 dias, mas para o Jorge, nosso amado filho, levou muito mais tempo. E foi maravilhoso vê-lo assimilar cada etapa do processo.
Lembro-me vividamente do dia em que ele foi sozinho ao banheiro pela primeira vez. Ele baixou suas calças, fez xixi, deu descarga e lavou as mãos. Parecia uma rotina simples para qualquer outra criança, mas para nós, foi um momento de pura euforia. Rimos e choramos de alegria, porque aquele momento era o resultado de nossa perseverança, de nossa fé nele e de todo o amor que investimos.
O suporte da escola e das terapeutas multidisciplinares, especialmente da terapeuta ocupacional, foi crucial para alcançarmos esse sucesso. Ela nos forneceu um encarte detalhado de como fazer o desfralde e, com isso, tomamos a decisão de seguir em frente sem voltar atrás. Nossa determinação foi recompensada ao contemplar a autonomia de nosso filho.
Ver o Jorge fazendo conexões com as coisas, com as pessoas e soltando uma nova palavra a cada dia foi uma experiência indescritível. Cada progresso era celebrado com tanto entusiasmo que parecia uma festa. Aprendemos a valorizar cada pequeno avanço e a entender que cada criança tem seu próprio ritmo e maneira de se desenvolver.
Hoje, olhamos para o Jorge com tanto orgulho e admiração. Ele nos ensinou a ter paciência, a acreditar nas pequenas vitórias e a nunca desistir. Sua evolução nos trouxe uma alegria imensa e nos mostrou que, com amor, apoio e perseverança, tudo é possível. Nossa jornada ainda continua, mas cada passo dado por ele é uma celebração da vida e da força que existe dentro dele.
Foto de capa por Karolina Kaboompics de Pexels
Respostas de 5
Importante depoimento. Por mais textos assim! Sucesso para vocês…
Oi Cinthia,
Que saudades de você, que texto maravilhoso, um verdadeiro abraço. Também tenho três autistas e uma luta diária. Agora estamos em um momento de calmaria após anos de tempestade.
Gratidão por compartilhar essa preciosidade, foi uma espécie de abraço em um mundo atípico com tantos desafios.
Um grande abraço
Debora
Grata pelo seu comentário! Vamos conversar mais sobre a temática! Tenho certeza que aprenderei muitas coisas com você! Um abraço!
Querida Cinthia, lendo o seu relato eu também me vejo nele, pois tenho um filho Autista. Cada evolução, pode parecer tão pequena aos olhos da sociedade, mas pra mim são grandes avanços. Me tornei Mãe Solo porque meu esposo faleceu vítima da Covid em 2021 e, de lá pra cá tenho que ser a Mãe e o Pai do meu filho. Lutas e mais lutas para exigir os direitos já adquiridos em lei, mas que a maioria das vezes não nos é contemplado. Temos que ser Resiliência, perseverantes e ter esperança como diz Freire “Esperançar (verbo)” para continuar nas nossas, nas minhas lutas diárias para poder conquistar e celebrar cada passo no desenvolvimento do meu filho, dos nossos filhos!!
Sinta-se abraçada por mim!!
Natieli Menezes, Mãe Atípica e Pedagoga. Sant’Ana do Livramento, RS. Fronteira com o Uruguay.
Ah, minha querida! Que abraço bom! Estou muito feliz em ler as suas palavras, deu um quentinho no coração. Vamos continuar em contato, siga-nos em @casamacanudo