Foto não enche barriga
Foto não cura ferida
Foto que mostra os dentes
Nem sempre estás contente
Foto não é gostar
Foto não te faz amar
Foto não traz justiça
Foto não impede miséria
Foto pode até mostrar
Foto insiste em informar
Foto pode trazer
Momentos fragmentados
Daquele que quis evidenciar
Foto só ilumina o ser
Se em arte se transformar
Foto pode até like, trazer
Quase sempre
Um dedo clicado
Nem sempre bem querer
Olhar instantâneo, automático
Despido de sentido humanizado
Foto em página volátil
Foto em gaveta guardada
Antes objeto de antanho
Hoje virtualmente no ar
Amanhã esquecida num piscar
Foto não é trepar
Foto jamais te fará amar
Foto não tem tato
Por isso não há de abraçar
Foto não é falar
Foto que o líquido dilui
Foto que mostra o real
Foto não vê caráter
Pode vileza esconder
Foto está a caráter
Se a foto é personagem
Narciso consciente
Ciente da vã ilusão
Foto não aplaca solidão
Foto
Real se mantém
No crítico olhar
Foto, que cego não vê
Foto cega
Se perde
Nesse infindo desvão
Foto só poderá
Iluminar
O que por dentro
Há de se ver
Se aquele, crítico
De si
Se puser a mostrar
Saber que há mais
Além do olhar
Foto, fotogenia,
Foto nossa de cada dia…
Foto de capa La réproduction interdite – Rene Magritte (1937) – Divulgação