01:26

Quem acompanha a minha coluna semanal sabe que escrevo há muito tempo sobre a pandemia, vacina, saudade, tempo e sobre a importância de não deixarmos nada para amanhã. Desde o começo, perdi as contas de quantas vezes sofri e/ou chorei a dor de um amigo que positivou ou perdeu alguém pela Covid-19. A doença não perdoa ninguém e infelizmente hoje quem sofre é a MINHA família, que desde o início se protegeu, se isolou, vibrou em cada cura e esperou ansiosamente pela vacina.

Fizemos o que era correto, nos preservamos e nos confinamos por amor à família e ao próximo. Quebramos o isolamento apenas uma única vez em novembro passado para comemorarmos o aniversário da minha mãe na casa da minha irmã. Foi emocionante nosso encontro, foi o único e último que nos vimos pessoalmente. Estávamos contando os dias para que quando nos encontrássemos não faltasse ninguém, inclusive quando nos juntamos virtualmente no Natal e Ano Novo passado foram essas as frases que mais repetimos: calma, vai passar, falta pouco, em breve estaremos todos juntos. Mas todo esse amor e cuidado da nossa parte, não foram suficientes para que não faltasse ninguém. Infelizmente vai faltar, já está fazendo MUITA falta.

Para nosso desespero, meu irmão caçula positivou. Achamos que ele estava brincando como sempre, mas era real. Meu irmão tinha asma e desde janeiro do ano passado já usava máscara e álcool em gel para se proteger. Eu brinquei com a cara dele inúmeras vezes dizendo que o vírus ainda não tinha chegado por aqui, mas ele tinha pavor de passar a doença para meus pais que moravam com ele. Viajei, pulei carnaval e meu irmão sempre de máscara. Ele precisou fazer terapia para lidar com o medo e a ansiedade que a pandemia estava causando. E a única coisa que ele fez durante esse tempo todo foi se cuidar em dobro e trabalhar. Seguiu todos os protocolos conforme manda o figurino. Tomava banho de álcool na rua, não precisava pegar transporte público e assim que voltava para casa a roupa ia direto para dentro da máquina e ele para o banho.

Por ironia do destino, pegou essa doença maldita na semana em que poderia se vacinar (por ser asmático) e na semana que completou 37 anos. Pegou de um colega de trabalho que por irresponsabilidade foi trabalhar três dias com febre e meu irmão ainda o alertou para fazer o teste, pois se pegasse poderia morrer por conta da asma. E foi justamente o que aconteceu. Meu irmão estava certo, no fundo ele sabia que o pior poderia acontecer e que não dependia somente dele. O irresponsável ainda teve tempo de se desculpar com meu irmão, não sei se ele o desculpou. Na verdade ele ficou muito revoltado. Só sei que EU NÃO aceito suas desculpas. Se quem perdoa é Deus, o negacionista que se vire com ele depois.

Meu irmão sofreu uma semana em casa com a tal “gripezinha” antes de internar, se consultou com pneumologista particular, fez fisioterapia pulmonar, vários exames (todos OK até então). A piora dele foi muito rápida, ele internou na sexta dia (11) com 75% dos pulmões comprometidos, foi para UTI no sábado dia (12), intubou no domingo dia (13), os rins começaram a perder a função e faleceu de parada cardíaca na madrugada do dia (19). Ele tentou, lutou e fez de tudo para melhorar. Foi um guerreiro, mas infelizmente perdeu a batalha para essa doença devastadora.

E foi assim breve, num piscar de olhos, sem despedida, sem velório, sem abraços… Estamos vivendo o luto individual, ainda não pude encontrar com a minha família. Continuamos com medo de nos perdermos. Não sabemos quem poderá ser o próximo!

Não é natural, não é normal, nada será igual, tudo perdeu a graça, perdeu o encanto, perdeu alegria e o sentido. Minha família não é a única atingida, o luto é coletivo, milhares estão dilaceradas pelo negacionismo e irresponsabilidade de muitos. Aliás, qualquer imbecil sabe que sintomas gripais durante uma pandemia é preciso se isolar e verificar. Se você não se preocupa com o próximo, você é assassino sim. Direta (sintomático) ou indiretamente (assintomático) você é culpado (a) SIM.

Nunca mais estaremos todos juntos fisicamente, a dor é imensa, é revoltante demais. A alegria de viver dele já está fazendo muita falta em nossas vidas. É inacreditável, um pesadelo, desesperador, dilacerante, desumano, incompreensível, desolador. O vazio que a saudade deixa é surreal, não vai passar!

Protejam-se, vacinem-se, cuidem-se! As lágrimas da saudade podem atingir vocês também, dizem que todas as famílias serão atingidas mais cedo ou mais tarde. Espero que não, de verdade!

O coração do meu amado irmão parou de bater às 01:26 no dia 19 de junho de 2021 e soprou um vazio inexplicável e irreparável dentro do nosso para sempre. Nosso zeloso “anjo” Gabriel foi bater suas asas em outra dimensão e tenho certeza que um dia iremos nos reencontrar. Obrigada por tanto! Te amaremos eternamente!