01 de maio de 1994. Domingo. Eu e meu pai na frente da televisão ansiosos para ver Ayrton Senna correr mais uma vez. Todas às vezes que Senna corria, estávamos lá assistindo e torcendo juntos. O perfume do molho caseiro de tomate da minha mãe tomou conta do apartamento. Pensávamos que seria um domingo normal como qualquer outro e que veríamos Senna ganhar. Fui ao banheiro e ouvi meu pai comentando que Senna estava diferente – uma das câmeras deu close e lá estava ele parado atrás do aerofólio olhando fixamente para seu carro por longos minutos.
A insegurança e o medo rondaram aquele circuito. Barrichello e Jordan se acidentaram na mesma pista anteriormente. No sábado que antecedeu a corrida, o piloto austríaco Roland Ratzenberger (Simtek) perdeu a vida na curva Villeneuve. Senna ficou extremamente abalado com a morte do colega e Sid Watkins que era chefe da equipe médica, havia pedido para Senna ajudá-lo a cancelar a prova. Tiveram aprovação imediata de outros pilotos, mas como infelizmente tudo na vida gira em torno do dinheiro a corrida seguiria. E aquele final de semana seria o início do fim. O dia mais triste da história do esporte mundial e principalmente para todos nós brasileiros.
GP de San Marino (Itália). Sinal verde. Foi dada a largada. Surgiu o primeiro acidente forte ainda no grid. Pedro Lamy (Lótus) acertou em cheio a traseira de J.J. Lehto (Benetton), que não havia largado. Com a brutalidade da pancada, o pneu se soltou, atravessou a cerca de proteção e feriu nove pessoas. A corrida continuou e na sexta volta ficamos órfãos do maior ídolo de todos os tempos. Senna (Willians) pole position e líder daquela prova passou reto e devido à alta velocidade, bateu violentamente na curva Tamburello.
Meu pai colocou as mãos na cabeça e gritou: o Senna morreu, o Senna morreu! Ficamos desesperados, choramos e um longo silêncio pairou no ar. Estávamos inconformados que deram sequência na corrida, no fundo sabíamos que naquele momento ele havia partido. Óbvio que aguardaram a corrida terminar para informar a notícia para todos.
Nunca mais esqueci daquele domingo, lembro que choramos muito. Meu pai e meu tio estavam inconsoláveis. Na época, eu era da equipe de vôlei da escola e minha técnica se organizou e nos levou para o velório dele. Naquela época tínhamos orgulho em carregar a bandeira do Brasil. Dividimos-nos em dois carros e o time inteiro foi prestar a última homenagem ao nosso maior ídolo.
Presenciei o maior ato de amor coletivo da vida, jamais tinha vivido aquilo. Só quem esteve lá sabe o que estou tentando descrever. Até hoje me emociono só de lembrar o que vivi naquele dia. O trajeto da escola até o Ibirapuera estava travado, dezenas de milhares de carros cobertos de verde e amarelo, faixas, buzinas e a música Tema da Vitória, criada pelo maestro Eduardo Souto, a pedido da Rede Globo, exclusivamente para uso nas transmissões de Fórmula 1 tocava alto nos carros que ali seguiam.
Era um mar de gente estranha chorando junto, abraçamos e enxugamos as lágrimas de dezenas de pessoas que jamais havíamos visto na vida. Era como se todos nós presentes formássemos uma grande família em luto. Um dava apoio ao outro. Nunca vi nada igual. Foram três horas de espera numa fila descomunal para nos despedirmos em apenas três minutos. Claro que entramos na fila novamente, não queríamos ir embora. Não queríamos deixá-lo. Até hoje é difícil de acreditar. Choramos por semanas. A pista molhada que ele tanto gostava de correr, secou. O ronco do motor silenciou para sempre.
Um ano antes de nos deixar, em 1993, Senna comemorou o encerramento da temporada no show da cantora Tina Turner, que o chamou no palco e o dedicou a música “The Best”. Virou hino!
Daquele dia em diante o automobilismo não teve mais o mesmo significado para nós e acredito que para muitos brasileiros também. Perdemos nosso tri campeão mundial, o maior piloto de todos os tempos. O insubstituível Ayrton Senna do Brasil – o Senna de todos!