Hoje é Halloween, uma celebração que importamos e festejamos de forma acanhada no Brasil. Momento esse, recordo das lembranças da infância, de fortalecimento ao pensar que a imagem da bruxa sempre esteve presente na minha vida. Fui àquela menina que passava horas em uma locadora procurando filmes com enunciado de bruxas. Recordo-me da atendente incomodada com minha presença demorada, sugerindo a locação com outras temáticas. Eu, enquanto uma criança trans, sem referências de outros corpos como o meu, precisava me identificar em algo que me sentisse representada. E, assim deu-se a magia do encontro pelas bruxas.
Sempre as visualizei como mulheres sagradas da natureza, sinônimo de inteligência, perspicácia e astúcia. Às vezes, me perguntava se as bruxas sentiam medo, provavelmente sim, mas não podiam demonstrar. A missão era enfrentar e vencer. E nessa guerra quem era ou ainda é o opressor?
A civilização nunca soube lidar com a liberdade dos corpos, com o feminino, com a religiosidade que vem da natureza e ancestralidade. Nunca aceitou que as mulheres dominassem territórios e pudessem usar da sabedoria para ajudar os seus. Era mais fácil mandá-las a inquisição. Será esse o motivo pelo qual as bruxas são consideradas pessoas más?
A sociedade sempre usou artimanhas para culpar o oprimido e acobertar os erros do opressor. Há séculos existe algo chamado “higienização existencial”, limpam as imagens que são consideradas afrontosas e evidenciam a pureza hipócrita e imunda de um povo. Vejam as fadas, o ser mitológico do encantamento e da pureza. No meu imaginário infantil sempre as considerei tontas! (rsrs)
Prefiro ser bruxa. A mulher com poderes de cura aos seus, aquela que dança junto ao fogo num ritual de transformação e que acalma corações com suas ervas. Utilizam a vassoura como instrumento de limpeza e também para voar. O voo que inspira e edifica outras mulheres. Somos o encarne de muitas que foram queimadas injustamente em diferentes épocas.
Somos a presença soberana em uma sociedade que segue preceitos de opressão. Tanto se fala do mundo moderno, mas por muitas vezes sinto-me na era medieval. Fogueiras foram ressignificadas em ódio e intolerância. O preconceito são faíscas que nos queimam pouco a pouco. Difícil a missão da sobrevivência quando somos almas livres!
Sigo afiando minhas unhas pretas e pontudas, no intuito de me conectar com as irmãs ancestrais. Exibo minha nudez ao espelho, passo meu batom vermelho sedutor e danço para celebrar a bruxa que habita em mim. Meu coração é doce e minha alma cheia de travessuras! E você já se conectou com sua bruxa interior hoje?
Feliz dias das bruxas, honeys!
Por Paola Valentina Xavier
para a coluna Paola COM VIDA.